Tema: A Formação
do Feudalismo
O processo de gestação do feudalismo foi bastante
longo: remonta à crise romana do século III, passando pela constituição dos
reinos germânicos nos séculos V-VI e pelos problemas do Império Carolíngio no
século IX, para finalmente se concluir por volta do ano 1000. Apesar de, em
cada região, os elementos constitutivos terem tido um peso diferente, podemos
afirmar que sete deles estiveram sempre presentes.
A Ruralização da Sociedade Ocidental
Este elemento tem raízes muito antigas. A
civilização romana na sua fase inicial estivera baseada na agricultura, porém,
devido às dificuldades apresentadas por aquele solo pouco favorável, o comércio
acabou por se tornar o setor econômico mais dinâmico. Contudo, as imensas
conquistas territoriais e o consequente afluxo de riquezas provocaram profundas
alterações, de grande alcance na sociedade e na economia latinas. Dentre elas,
um grande crescimento do número de escravos, o enfraquecimento da camada de
pequenos e médios proprietários rurais e a concentração de terras nas mãos de
poucos indivíduos.
Essa era uma sociedade urbana,
naturalmente a crise se manifestava mais claramente nas cidades, com as lutas
sociais, a retração demográfica, a pressão do banditismo e dos bárbaros, a
contração do comércio e da indústria artesanal. Entende-se, portanto, por que
os mais ricos se retiravam para suas grandes propriedades rurais (villae), onde
estariam mais seguros e poderiam obter praticamente tudo aquilo que
necessitavam para viver.
O Enrijecimento da Hierarquia Social
Enquanto na Roma Clássica o critério fundamental
de diferenciação social era a liberdade, a partir do século IV estabeleceu-se a
vitaliciedade e hereditariedade das funções, isto é, a atividade de cada
indivíduo – não importa se senador ou camponês, professor ou comerciante,
soldado ou artesão – valia por toda sua vida e era imposta a seus filhos.
A Fragmentação do Poder Central
Aquela situação socioeconômica ao mesmo tempo
reforçava e era reforçado pelo enfraquecimento e desmembramento do poder
político estatal. Com a ruralização, a tendência à autossuficiência de cada
latifúndio e as crescentes dificuldades nas comunicações, os representantes do
poder imperial foram perdendo a capacidade de ação sobre os vastos territórios.
Mais do que isso, os próprios latifundiários foram ganhando atribuições que
eram anteriormente da competência do Estado. Em suma, ocorria um retrocesso das
instituições públicas, ou melhor, sua apropriação por parte de individuou que
detinham grandes extensões de terras e nelas exerciam, em proveito próprio,
atribuições anteriormente pertencentes ao Estado.
O Desenvolvimento das Relações Pessoais
De tudo que acabamos de ver, resultou um
fortalecimento das relações pessoais em prejuízo das institucionais.
Todavia a instituição que mais êxito teria no
desenvolvimento das relações de dependência pessoal foi a vassalagem.
É verdade que, inicialmente, no século VI, a
palavra “vassalo” tinha uma conotação servil, mas desde princípios do século
VII ela passou a ser empregada também para se referir aos homens livres, ainda
que de condição inferior. Por fim, como desde o começo do século VIII elementos
da aristocracia entravam nas relações vassálicas, estas acabaram por se
enobrecer e mesmo, mais tarde, por se tornar exclusividade dessa camada social.
Como observou o historiador belga François-Louis
Ganshot, “a difusão das relações vassálicas acabou por subtrair, em larga
medida, um grande número de homens livres à autoridade imediata do Estado”. Mas
também, lembra o mesmo autor, essas relações mantinham vínculo entre os grandes
senhores territoriais e o rei, fornecendo “um elemento, e até elemento capital,
de resistência à completa dissolução do Estado”.
A Clericalização da Sociedade
Desde a cristianização do Império Romano ocorreu
a clericalização da sociedade ocidental em dois sentidos: quantitativamente, porque
a proporção de clérigos em relação ao conjunto da população tornava-se muito
superior à que existira no paganismo ou mesmo que viria a existir em outras
sociedades; qualitativamente, porque o clero tornava-se um grupo social
diferenciado dos demais, possuidor de privilégios especiais e de grande poderio
político-econômico.
Em uma só palavra, monopolizando a comunicação
com Deus, o clero tornava-se o responsável por todos os homens.
Perfeitamente integrada na economia agrícola da
época, a Igreja passou a receber e ceder benefícios. Tinha, portanto, vassalos,
colonos e escravos. Desde o século IX ela detinha, estima-se, um terço das
terras cultiváveis da Europa católica.
As transformações na mentalidade
A mentalidade tem um ritmo histórico muito mais
lento que os fatos sociais, econômicos ou políticos. Para nós, aqui, basta
lembrar três dessas transformações: um novo relacionamento homem-Deus, uma nova
concepção do papel do homem no universo e uma nova auto concepção do homem.
Firmava-se aos poucos uma mentalidade
simbólica que via no mundo um grande enigma decifrável somente pela fé. Um
mundo que ganharia sentido apenas por intermédio de Deus, e que gerava então
uma nova forma de relacionamento entre Ele e os homens. A razão passava a ser
vista como um instrumento diabólico, que mantinha o homem na ilusão de uma
falsa sabedoria que o afastava da Verdade. A natureza passava a ser vista como
um véu entre a humanidade e Deus.
Franco Júnior, Hilário. 1999. Formação. Feudalismo – Uma
sociedade religiosa, guerreira e camponesa. São Paulo: Ed. Moderna. (Texto
adaptado)
Responda
as questões sobre o texto:
1. O texto acima
foi adaptado de um dos livros sobre Idade Média do historiador Hilário Franco
Júnior, considerado um dos maiores estudiosos do assunto no Brasil. Após muitos
anos de estudos, o historiador elaborou a sua interpretação sobre o processo de
formação do Feudalismo. Cite as causas que teriam gerado o Feudalismo segundo
Hilário Franco Júnior. De acordo com a sua opinião, destaque um dos motivos que
teriam formado o Feudalismo.
As origens do
sistema feudal remontam à crise do escravismo romano, iniciada no século III,
que abalou seriamente a economia e fez surgir o colonato. A plebe foi
abandonando as cidades em busca de trabalho e proteção no campo, colocando-se
sob a dependência dos proprietários rurais. A fixação dos camponeses à terra
fortaleceu a ruralização e a autossuficiência das vilas (latifúndios). As
invasões germânicas contribuíram para o êxodo urbano. Vivendo da exploração das
terras, os germanos tomaram propriedades ou tornaram-se camponeses como os
colonos, regulando suas vidas com base nos costumes. A formação dos reinos
romano-germânicos manteve a dependência entre as pessoas: senhores e
camponeses, por meio de obrigações, reis e senhores, por meio do comitatus e da
doação de terras e cargos. No início do século IX, disputas pelo poder no
Império Carolíngio levaram à descentralização do poder real, já enfraquecido
pelas doações de feudos.
2. Transcreva do
texto frases que expliquem as seguintes afirmações:
a) Decadência da
vida urbana:
“(...) naturalmente a crise se manifestava mais claramente
nas cidades, com as lutas sociais, a retração demográfica, a pressão do
banditismo e dos bárbaros, a contração do comércio e da indústria artesanal.
Entende-se, portanto, por que os mais ricos se retiravam para suas grandes
propriedades rurais (villae), onde estariam mais seguros e poderiam obter
praticamente tudo aquilo que necessitavam para viver.”
b) A Igreja não
se restringia à religiosidade:
“Perfeitamente integrada na economia agrícola da época, a
Igreja passou a receber e ceder benefícios. Tinha, portanto, vassalos, colonos
e escravos. Desde o século IX ela detinha, estima-se, um terço das terras
cultiváveis da Europa católica.”
c) O Rei não
tinha poderes, além das muralhas de seu feudo:
“Com a ruralização,
a tendência à autossuficiência de cada latifúndio e as crescentes dificuldades
nas comunicações, os representantes do poder imperial foram perdendo a
capacidade de ação sobre os vastos territórios. Mais do que isso, os próprios
latifundiários foram ganhando atribuições que eram anteriormente da competência
do Estado.”
d) As leis foram
substituídas pelas relações pessoais:
“a difusão das relações vassálicas acabou por subtrair, em larga
medida, um grande número de homens livres à autoridade imediata do Estado”. “(...)
essas relações mantinham vínculo entre os grandes senhores territoriais e o
rei, fornecendo “um elemento, e até elemento capital, de resistência à completa
dissolução do Estado”.
3. Caracterize a
sociedade feudal.
A sociedade feudal,
estamental e hierarquizada, compreendia três camadas principais: clero, nobreza
e servos. Os dois primeiros eram detentores, respectivamente, da autoridade
espiritual (religiosa) e da temporal (política), embora o alto clero,
administrador dos feudos eclesiásticos, exercesse os dois poderes. Os senhores
dos feudos dominavam o campesinato preso à terra (servos) e, em troca de
assistência religiosa e proteção militar, exigiam dele obrigações
consuetudinárias em gêneros ou trabalho. A sociedade feudal compreendia ainda segmentos
menores, com funções específicas, como os ministeriais (funcionários do feudo),
os soldados comandados pelo senhor e os vilões (camponeses livres que
trabalhavam no manso senhorial).
4. Explique as
relações de poder na Idade Média Europeia a partir do esquema abaixo.
1. Rei
2. Grandes
vassalos
3. Pequenos vassalos
Durante a Idade
Média, a terra tinha grande significado. Deste modo, tornou-se comum a
concessão de terras em troca de serviços prestados. Esta concessão dava-se
entre nobres. Aquele que concedia era o suserano e o que a recebia seu vassalo.
Construía-se entre os dois uma relação horizontal, de ajuda mútua. O vassalo jurava
fidelidade ao seu suserano, prometendo acompanhá-lo em tempos de guerra, além
de pagar seu resgate caso fosse preso. O suserano, por seu turno,
comprometia-se a proteger militarmente o vassalo e conferir-lhe o direito de
posse daquela terra. Embora a relação fosse horizontal, de igual para igual, em
termos hierárquicos, o suserano encontrava-se acima do vassalo. Neste contexto, o rei era o suserano mor,
dono de todas as terras, a quem todos devinha obediência e fidelidade. Contudo,
na prática, não era bem assim. Com a contínua divisão da terra e o amplo
poderio dos senhores feudais, o poder real foi desfragmentando-se, de modo que
os feudos passaram a auto-governar-se, com regras e “governos” próprios. O rei,
progressivamente, perdia poder e influência. Havia, também, relações sociais de
servidão entre o senhor das terras e o camponês (servo) - não possuidor de
terras. O servo tinha vínculos com a terra e, pelo direito de usá-la para seu
sustento e em troca de proteção, era explorado e submetido a diversas
obrigações pelos nobres detentores das terras.
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